Naquela noite, enquanto descansava na propriedade do Conde, Tabitha olhou pela janela de seu quarto, observando as luzes de Ipswich piscando ao longe. Ao seu lado, Amélie dormia numa poltrona, exausta, mas serena.
Ethan permanecia na propriedade, a sua presença era um conforto silencioso. Tabitha sabia que novos desafios a esperavam, mas pela primeira vez em muito tempo, sentiu-se segura.
"Agora sei que não estou sozinha. E, com eles ao meu lado, posso enfrentar qualquer coisa."
Os dias na mansão do Conde de Devonshire, em Ipswich, passaram a ter um ritmo próprio, uma rotina cuidadosamente orquestrada pela governanta e pela vontade férrea do Conde. O casarão, com seus corredores longos e adornados por tapeçarias antigas, era uma mistura de tradição e imponência, cada detalhe refletindo o prestígio da família.
Tabitha, embora grata pela segurança do lar, sentia-se um tanto deslocada. As suas manhãs começavam cedo, com o som de criados movendo-se pelos corredores e o aroma de chà fresco e pão assado vindo do andar inferior. Após o café da manhã, servido no salão iluminado pelas janelas altas, ela costumava passear pelos jardins vastos e bem cuidados, tentando encontrar algum equilíbrio interno.
Os criados jà se tinham habituado a vê-la caminhar entre as roseiras, perdida em pensamentos. Às vezes, Amélie a acompanhava, sempre oferecendo palavras gentis e encorajadoras.
— Minha menina, — dizia Amélie, enquanto ajustava o chapéu de Tabitha para protegê-la do sol. — O mundo agora està cheio de possibilidades. Não tenha medo de explorà-las.
Ethan, que fora convidado a permanecer na propriedade como hóspede do Conde, aparecia quase todos os dias. Embora sempre mantivesse o tom de respeito e formalidade com o Conde, ele não escondia o seu interesse em passar tempo com Tabitha.
— Vamos dar um passeio? — sugeriu ele uma manhã, ao encontrà-la no jardim. — Hà uma trilha que leva ao riacho nos fundos da propriedade. Parece um bom lugar para esquecer os problemas, mesmo que seja só por um momento.
Tabitha hesitou, mas o sorriso encorajador dele venceu a sua resistência.
— Està bem. Vamos.
O caminho era cercada por carvalhos altos, cujas folhas criavam um mosaico de luz e sombra no caminho. O som do riacho ao longe misturava-se com o canto dos pàssaros, e Tabitha sentiu-se estranhamente à vontade.
— É estranho, — disse ela, quebrando o silêncio. — Estar aqui, rodeada de tanta calma, depois de tudo o que passamos.
Ethan, caminhando ao lado dela, olhou para o horizonte.
— Talvez seja a maneira do mundo de nos lembrar que sempre hà algo a preservar, — respondeu ele. — Mesmo nas maiores tempestades, a paz pode ser encontrada... se soubermos onde procurar.
Quando chegaram ao riacho, Ethan apontou para uma pedra plana perto da àgua.
— Vamo-nos sentar. Quero saber como està realmente, Tabitha.
Ela aceitou, sentando-se ao lado dele, os dois observando a àgua cristalina que refletia os raios do sol. Tabitha suspirou.
— Estou a tentar me adaptar. Meu avô tem sido muito gentil, mas não sei se ele realmente entende quem eu sou. Eu não sou uma menina além disso não nos conhecemos. E isso assusta-me.
Ethan pegou uma pequena pedra e lançou-a no riacho, observando as ondulações que se formaram.
— Você sobreviveu a uma experiencia muito traumàtica, perdeu os seus pais e està num país novo mas isso não significa que perdeu quem é. Na verdade, acho que està mais próxima da sua verdadeira essência do que nunca.
Tabitha olhou para ele, tocada por suas palavras.
— E você? Como està lidando com tudo isso?
Ele deu um leve sorriso.
— Um dia de cada vez. Mas tê-la por perto torna tudo mais fàcil.
Os dois trocaram um olhar cheio de significado antes de se levantarem e começarem a caminhar de volta à mansão.
As noites na mansão eram sempre marcadas por jantares formais no salão principal, com o Conde presidindo a mesa. Tabitha, embora não gostasse de toda a pompa, fazia questão de seguir as regras para agradar ao avô. Ethan, sentado a algumas cadeiras de distância, lançava olhares discretos e cúmplices, tornando as longas refeições mais suportàveis.
— Ethan, — dizia o Conde em uma dessas noites. — Estou bastante impressionado com sua conduta. Acredito que serà uma influência positiva para Tabitha, especialmente agora,que ela se està a integrar na sociedade.
— A sua confiança significa muito para mim, My Lord, — respondia Ethan. — Sempre estarei grato por tudo o que fez por mim.
Tabitha, observando a troca de palavras, sentia uma mistura de alívio e apreensão. Sabia que seu avô confiava em Ethan, mas temia que isso pudesse mudar se o Conde percebesse os verdadeiros sentimentos entre os dois.
À noite, no silêncio de seu quarto, Tabitha ficava à janela, olhando para os campos iluminados pelo luar. A presença de Ethan trazia uma nova dinâmica à sua vida, uma que ela não sabia como controlar. O mundo no qual estava inserida parecia cheio de expectativas, e ela não tinha certeza como equilibraria isso com o que seu coração desejava. "Serà que sou forte o suficiente para tomar minhas próprias decisões? Para enfrentar meu avô e o que a sociedade espera de mim?" pensava ela. Mas, mesmo no meio das dúvidas, a presença de Ethan era uma âncora, um lembrete de que ela não estava sozinha.