O Som Do Meu Destino

CAPÍTULO 1 – Quando Nossos Caminhos se Cruzam 

Era uma manhã de outono.
O despertador tocava sem piedade, insistente, como se desafiasse Mia a enfrentar mais um dia. Com os olhos ainda semicerrados, ela tateou até encontrá-lo e apertou o botão. O silêncio voltou, mas o cansaço permaneceu — um velho conhecido.

Mia se levantou devagar. O corpo inteiro parecia pesado. Dois empregos exigiam mais dela do que qualquer pessoa deveria dar, mas era o necessário para pagar as contas. A rotina exaustiva era, ironicamente, a única coisa estável em sua vida. Talvez porque, desde cedo, ela aprendera que nada ficava por perto por muito tempo.

Aos oito anos, perdeu a mãe de forma brusca. Era pequena demais para entender, mas grande o suficiente para sentir o vazio que tomou conta da casa. O pai tentou cuidar dela por alguns anos… até não tentar mais. Quando Mia estava a poucos meses de concluir o ensino médio, ele arrumou suas coisas e saiu. Deixou apenas um bilhete curto:

“Eu não sei como ser pai.”

Nunca mais voltou.

Desde então, Mia aprendeu a viver sozinha — e sobreviver dói.

Às 04h45 ela estava em pé, prendendo o cabelo em um coque apressado, vestindo o uniforme azul simples do Supermercado Bom Preço da Serra. Tomou um café fraco e seguiu pela rua gelada. O ar da madrugada cortava seu rosto, mas ela já estava acostumada. Quase tudo, de alguma forma, já tinha doído antes.

O mercado ficava a três quadras. No depósito, Mia verificava mercadorias, conferia prazos de validade e organizava prateleiras. Às sete, abria o supermercado e atendia clientes. Nada glamouroso — apenas o que pagava parte das contas.
A outra parte vinha do Restaurante Estrela da Serra, onde trabalhava à noite como garçonete.

O restaurante era pequeno, acolhedor, iluminado por lâmpadas amareladas e com mesas de madeira marcadas pelo tempo. Ali, caminhoneiros, casais e famílias se reuniam. Todo mundo conhecia todo mundo. Era quase um lar — quase.

Mia chamava sua vida de sobrevivência. Não ousava chamar de escolha.

Naquela manhã, enquanto colocava caixas nas prateleiras do corredor de produtos de limpeza, colocou seus fones de ouvido e começou a cantar baixinho. Era um hábito, talvez o único espaço de liberdade que ainda guardava para si.

Sua voz encheu o corredor estreito — suave, melancólica, carregada de tudo que ela nunca dizia em voz alta.

Foi exatamente nesse instante que Miguel entrou no supermercado.

Mia não cantava alto quando havia clientes, mas, achando-se sozinha, deixou a voz escapar um pouco mais. Apenas o suficiente para aliviar o peso do peito.

O que ela não sabia era que alguém estava chegando mais perto.

Miguel só tinha parado ali para comprar água e um carregador portátil. Estava de passagem pela pequena Serra Azul, indo para uma reunião em um pequeno estúdio da cidade vizinha. Caminhava apressado até os caixas quando o som chegou aos seus ouvidos.

Miguel era produtor musical — um dos bons — mas carregava feridas profundas.
A última mulher em quem ele apostou, e que amava, alcançou o sucesso… e o deixou. Mais tarde, caiu em um relacionamento abusivo e tirou a própria vida. Desde então, Miguel nunca mais acreditou em ninguém. Nem em si mesmo.

Mas aquela voz…

Não era comum.
Era limpa. Doce. Ferida e, ao mesmo tempo, forte.

Ele parou no meio do corredor, confuso.

Olhou ao redor — parecia vazio.
Mas a música continuou, como se viesse de um coração escondido.

Intrigado, deu dois passos para trás, tentando seguir o som. Antes que pudesse fazer isso, uma funcionária chamou:

— Senhor, pode vir nesse caixa.

Ele hesitou — apenas um segundo.
Mas acabou indo.

Enquanto pagava, ainda tentava ouvir a voz.
Mas ela cessou.

Talvez tivesse imaginado.
Talvez fosse só mais alguém no turno da manhã.

Miguel saiu do supermercado com uma sensação estranha:
a de que tinha acabado de ouvir algo importante…
mas não sabia o quê.

À noite, Mia correu do supermercado para o restaurante. O cansaço pesava, mas ela precisava continuar. O aroma de alho frito e comida quente do Estrela da Serra era reconfortante — quase um abraço.

Serviu mesas, limpou pratos, anotou pedidos e tentou não pensar em tudo o que não tinha.

Como Pedro, por exemplo.

Pedro…
Seu primeiro amor.
O amigo de infância que dividia lanche, segredos e sonhos. Cresceram juntos, estudaram juntos, se apaixonaram no ensino médio.
Mas quando o pai dela foi embora, a vida cobrou caro. Mia precisou trabalhar.
Pedro seguiu para a faculdade.

O amor não acabou.
Só ficou impossível.

Quase no fim do expediente, o restaurante estava quase vazio.
No canto, tomando um café frio, estava apenas um cliente usando um boné preto, concentrado no celular.

Miguel.
O mesmo do supermercado.

Quando o movimento diminuiu, seu Agenor, o dono do restaurante, aproximou-se com seu sorriso manso:

— Mia, canta uma para fechar o dia?

Ela arregalou os olhos.
— Hoje não, seu Agenor… estou acabada.

— Canta, menina. Faz bem para a alma.

Talvez pelo cansaço, talvez pela saudade da mãe — que sempre dizia que a voz dela era um presente — Mia respirou fundo e cedeu.

Fechou os olhos.

E cantou.

Era a mesma melodia da manhã, mas agora mais forte, mais viva. Sua voz encheu o restaurante quase vazio com uma intensidade que revelava suas cicatrizes e esperanças.

Miguel levantou a cabeça instantaneamente.

Essa voz.
Assim como eu persegui mentalmente ou passei um dia lá dentro.

Ele se levantou e vagou, como se estivesse se aproximando de algo frágil e precioso.

Quando Mia abriu os olhos, ela levou um susto ao vê-lo tão perfeito.

Miguel respirou fundou, quase encontro da coincidência.

— Não dou crédito... foi vocal. Uma voz de supermercado.




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