Do outro lado do salão Damien ajeitou o casaco com um gesto despreocupado e olhou para Gabriel. O traje dele era irrepreensível, o corte da casaca perfeito, os detalhes meticulosamente alinhados.
— Tenho de admitir, Sinclair, ver-te assim tão impecável é uma raridade. Quase te confundiria com um verdadeiro nobre.
Gabriel ergueu uma sobrancelha, lançando-lhe um olhar divertido.
— Que comentário encantador, Damien. Devo sentir-me lisonjeado?
Damien riu-se, dando uma pancada leve no ombro do amigo.
— Só digo a verdade. Sempre estiveste mais confortável com botas cheias de sal e camisas desabotoadas. Mas vê pelo lado positivo, talvez Lilian aprecie a mudança.
Gabriel não respondeu de imediato. Em vez disso, passou os dedos pelo punho do casaco, ajeitando-o, antes de lançar um olhar pelo salão.
— Lilian já me conhece bem o suficiente para saber que a minha roupa não muda quem sou.
Damien deu-lhe um sorriso malicioso.
— Talvez. Mas também sei que sabes usar o charme a teu favor. Talvez seja altura de aplicares as mesmas táticas com Lilian.
Gabriel não respondeu. Os seus olhos já tinham encontrado Lilian do outro lado do salão, e naquele momento, tudo o resto se tornou irrelevante. Damien, que seguia a linha do seu olhar, abanou a cabeça com um meio sorriso.
— Não vais descansar enquanto não a tiveres nos braços, pois não?
Gabriel manteve-se em silêncio por um momento, mas a intensidade no seu olhar dizia tudo.
— Algumas coisas não podem ser ignoradas.
Damien soltou uma breve gargalhada.
Gabriel não precisou de mais incentivo. Atravessou o salão com confiança, cada passo firme levando-o inevitavelmente ao encontro dela, como se não houvesse força capaz de o deter. Parou à sua frente. A profundidade do olhar dele despertou-lhe uma emoção que lhe apertou o peito e fez o coração vacilar.
— Lilian — murmurou ele, a voz baixa, íntima.
Ela engoliu em seco, os dedos a apertarem a haste da taça.
— Gabriel.
A distância entre eles era ínfima, a presença dele a envolvê-la. Mas, antes que pudesse responder, a presença de Whitaker surgiu novamente, cortando o momento com a delicadeza de uma lâmina
— Lady Lilian, não me concederia esta dança?
O tom era cortês, mas a rigidez na voz denunciava que não era um pedido. Era uma ordem. Lilian hesitou, sentindo o olhar de Gabriel sobre si, como uma promessa silenciosa. Mas, rodeada pelo salão cheio de convidados e pelas regras do seu mundo, não tinha alternativa. Com um aceno elegante, aceitou.
Whitaker puxou-a para a pista de dança sem a menor delicadeza. Um claro contraste com a forma como a tinha segurado anteriormente, segurava-a com força, os dedos a apertarem-lhe a cintura como um aviso. Inclinou-se ligeiramente, o tom baixo, ameaçador.
— Já tolerei demasiado as tuas fantasias, Lilian. Mas esta farsa termina aqui. És minha noiva — e farás o que for exigido de ti, gostes ou não.
Lilian sentiu a pele arrepiar-se com a ameaça subtil. Antes que pudesse responder, Lady Penélope surgiu ao seu lado, a expressão tranquila e o tom cordial.
— Lord Whitaker, creio que Lilian poderá precisar de um momento para recuperar o fôlego. A noite ainda agora começou, e tenho a certeza de que desejará vê-la deslumbrar-nos por muitas horas.
O sorriso de Whitaker permaneceu, mas os olhos semicerraram-se ligeiramente. Ele não podia contestar sem parecer rude, não diante de Lady Penélope e de todos os que discretamente observavam.
— Naturalmente — respondeu com a formalidade necessária, soltando a mão de Lilian com relutância. — Afinal, não queremos que perca as forças demasiado cedo.
Lady Penélope pousou suavemente a mão no braço da afilhada, com uma segurança tranquila que não admitia contestação. A expressão continuava serena, mas o gesto era firme. Quando estavam a uma distância segura, voltou-se para Lilian e falou num tom gentil, mas intencional.
— Minha querida, esta noite é tua. Não deixes que um único par de mãos te retenha por demasiado tempo. Tenho a certeza de que Lord Sinclair não recusaria uma dança contigo.
Antes que Lilian pudesse responder, sentiu o calor de uma mão a envolver a sua.
— Se Lilian o permitir — murmurou Gabriel, a voz baixa e envolvente — serei eu o privilegiado desta vez.
O olhar dela subiu até ao dele, encontrando aqueles olhos azuis que sempre pareciam ver demasiado.
— Não precisavas ter insistido nesta dança — murmurou Lilian, tentando ignorar o efeito da proximidade dele.
Gabriel inclinou-se ligeiramente, os olhos divertidos.
— E perder a única oportunidade que tenho de te ter nos meus braços esta noite? Seria um desperdício.
Lilian desviou o olhar, mas a forma como ele a segurava não lhe permitia escapar.
— És impossível.
Gabriel apertou-lhe levemente a mão, conduzindo-a com suavidade.