Na carruagem à frente, Whitaker mantinha o olhar na noite que desfilava pelas janelas. Não pensava em Lilian. Não verdadeiramente. Esse assunto, para ele, já estava resolvido — apenas demorava mais do que o conveniente.
O casamento aconteceria. Mais cedo ou mais tarde. Porque era assim que as coisas funcionavam. E Lilian, como todas as mulheres do seu mundo, acabaria por compreender o óbvio: a vontade dela não tinha qualquer relevância.
O que lhe ocupava os pensamentos, naquela noite, era bem mais importante.
Pousado ao seu lado, o convite para o baile do Palácio permanecia esquecido. A carta que realmente lhe interessava fora outra — a que chegara naquela manhã, vinda dos seus sócios.
O navio estava pronto.
O embarque aconteceria dentro de dias.
E o recado fora claro.
Ou o dinheiro aparece... ou o navio não parte.
Passou os dedos devagar pela borda da luva, o olhar a endurecer.
Aquela operação era demasiado valiosa. Uma rota nova. Homens suficientes para renderem uma fortuna na América. E se aquele transporte corresse bem… as portas abrir-se-iam para outro nível de negócios. Um nível onde nem Gabriel Sinclair — nem os favores da Coroa — poderiam alguma vez tocá-lo.
O problema era o habitual. Dinheiro.
O investimento era pesado. E os sócios estavam a pressioná-lo. Por um momento, o pensamento recuou até Lilian — ou melhor, à sua recente obstinação. Desde que lhe mostrara a carta, ela recusara vê-lo. Alegava estar indisposta.
Tentara por diversas vezes abordá-la — flores, bilhetes, recados cordiais... mas a resposta era sempre a mesma.
Lady Lilian encontra-se indisposta.
Um sorriso frio desenhou-se-lhe nos lábios.
Indisposta...
Claro que sim.
Recostou-se, os olhos semicerrados, o pensamento já muito longe de Lilian Cavendish.
Porque, no fim, a vontade dela não alterava nada.
Ele sempre conseguia o que queria. Sempre.
***
A fila de carruagens formava um espetáculo digno da corte, os cascos dos cavalos ressoando nos empedrados. Criados alinhavam-se para ajudar os convidados a descer, e os candelabros reluziam nos corredores da entrada do Palácio.
Quando Lilian saiu da carruagem, os murmúrios cessaram por um instante. Ela irradiava uma beleza impossível de ignorar. O vestido branco contrastava com o seu cabelo escuro, as pedras bordadas na saia brilhavam como se carregassem a luz da própria lua.
Atrás dela, o Duque de Cavendish desceu com a mesma altivez de sempre. Mas quando o olhar dele encontrou o da filha — por um instante, apenas — Lilian viu o que nunca imaginara ver: hesitação. Não reprovação. Não desaprovação. Apenas... humanidade.
Lady Penélope surgiu logo depois, e juntos avançaram para o interior do Palácio.
No topo das escadas, antes de entrarem no grande salão, o Duque de Cavendish estendeu-lhe o braço. Um gesto simples. Um gesto inesperado.
Lilian olhou-o, surpreendida.
Ele não sorriu. Nem suavizou o tom. Mas quando falou, a sua voz tinha um tom que ela reconhecia — orgulho.
— Levanta a cabeça, Lilian — disse. — És minha filha.
Por um instante, o coração dela saltou. Não era um pedido. Era uma ordem. Mas, vinda dele... naquele momento... era tudo o que precisava. O pai nunca a ia abandonar.
Lilian pousou a mão no braço do pai.
E foi Lady Penélope, ao seu lado, que completou em tom baixo, cúmplice:
— E agora, minha querida… é o momento de mostrar a todos quem realmente somos.
Lilian inspirou fundo.
E desceram as escadas juntos.
Dentro do salão, Gabriel acabara de chegar. Estava a tirar as luvas quando a viu. E o mundo... simplesmente... parou.
Do outro lado da sala, Whitaker também percebeu o impacto que Lilian causava. E o sorriso que lhe surgiu nos lábios não tinha nada de agradável.
***
O Salão de Baile do Palácio de St. James era uma visão de esplendor e grandiosidade. Lustres imponentes iluminavam os mármores polidos, e o teto pintado retratava cenas mitológicas sob um fundo estrelado. A música flutuava pelo ar, uma melodia elegante que marcava o compasso da noite.
A aristocracia já se movimentava pelo salão, cumprimentando-se com sorrisos aprendidos e sussurros disfarçados atrás de leques e copos de champanhe. Mas todos sabiam que aquela noite não era como as outras. O rei chamara a nobreza por um motivo, e o escândalo que pairava tornava cada troca de olhares mais carregada de significado.
Lilian sentiu-se observada e avaliada à medida que se movia pelo salão ao lado da tia e do pai. Mas o que realmente a incomodava eram os sussurros abafados. Falavam dela. E foi por isso que não se surpreendeu quando Lord Sebastian apareceu à sua frente.