O salão permanecia suspenso num silêncio absoluto. Todas as atenções estavam voltadas para Lilian, cujo coração martelava com força dentro do peito.
O olhar do Rei encontrava-se cravado nela, expectante.
Gabriel, de pé a poucos metros, observava-a com uma intensidade que queimava. Não havia mais nada que pudesse fazer. A decisão era dela.
Lady Penélope deu um pequeno passo à frente, o seu olhar a transmitir-lhe força.
— Minha querida, este é o momento em que decides o teu próprio futuro.
O Duque de Cavendish permaneceu impassível, mas Lilian viu o orgulho no seu olhar.
O Rei sentou-se e recostou-se no trono, observando a cena com interesse.
— Lady Lilian, a decisão é sua. Deseja manter este compromisso?
Silêncio.
Então, Lilian respirou fundo e ergueu o queixo.
— Não.
A palavra ecoou pelo salão como um golpe fatal. O Rei assentiu levemente.
— Muito bem. O noivado entre Lady Lilian e Lord Whitaker está oficialmente anulado.
O olhar de Lilian permaneceu cravado no chão por um instante, enquanto assimilava tudo o que acontecera. A verdade estava ali. Tão óbvia que se sentiu tonta por não a ter visto antes. Não se apercebia dos murmúrios que varriam o salão nem dos olhares que recebia.
A carta … O coração apertou-se quando o pensamento lhe atravessou a mente. Aquela carta era uma mentira. Sempre fora. Cada detalhe, cada palavra escrita… tudo fazia parte de um plano meticuloso para afastá-la de Gabriel. E ela tinha caído nessa armadilha. Ela ergueu o olhar para ele, que a observava, como se esperasse por algo.
Por ela. E eu duvidei dele.
A culpa encheu-lhe o peito. Ele sempre lhe dissera a verdade. Lutara por ela, contra tudo e contra todos, e ela… Ela acreditara em Whitaker. Soubera exatamente como manipulá-la. Tocara na sua maior fraqueza, o medo de confiar e ser traída.
Lady Penélope, que estava ao seu lado, tocou-lhe no ombro suavemente.
— Minha querida…
Mas ela não precisava de conforto. Precisava de ir até ele. Agora.
Endireitou-se, respirou fundo e atravessou o salão. Os sussurros tornaram-se mais rápidos, mais sonoros, mas ela não hesitou. Cada passo era um voto de confiança, uma reafirmação do que sentia, do que sempre sentira.
Quando parou diante de Gabriel, sentiu o estomago embrulhado. Ele olhou-a. Ela engoliu em seco.
— Gabriel… perdoa-me.
Continuou, sentindo as lágrimas arderem-lhe na garganta.
— Eu devia ter confiado em ti. Devia ter ouvido o meu coração em vez de permitir que Whitaker me manipulasse.
Gabriel ficou em silêncio por um instante, e depois, um sorriso pequeno, quase relutante, curvou-lhe os lábios.
— Lilian…
Ele deu um passo na sua direção, a mão estendendo-se hesitante até tocar na dela.
— Diz-me… ainda acreditas em mim?
Ela não hesitou.
— Sempre acreditei.
A sua voz tremeu.
— Eu só tive medo. Mas agora sei que o medo não pode controlar o que sinto por ti.
Gabriel olhou-a por um instante, como se procurasse qualquer hesitação. Mas encontrou apenas certeza. Então, finalmente, ele sorriu. E Lilian sentiu-se livre.
— Se ainda me quiseres...
A sua voz saiu baixa, mas firme.
Gabriel não esperou mais. Em vez de responder com palavras, tomou-lhe as mãos e puxou-a para um beijo. O salão explodiu em murmúrios e suspiros de espanto. O escândalo já não importava. A aristocracia sempre teria algo para comentar, mas pela primeira vez, Lilian não se importou.
Afastaram-se ligeiramente, e Gabriel olhou-a com um sorriso leve.
— Sempre quis.
O Duque, que observava tudo à distância, soltou um longo suspiro e virou-se para Lady Penélope.
— Isto nunca poderia ter terminado de outra forma, pois não?
Ela sorriu levemente.
— Não, Theodore. Nunca poderia.
O Rei levantou-se, encerrando a noite com uma última declaração.
— Então está decidido. Um novo noivado, um novo destino. Espero que façam bom uso da liberdade que conquistaram.
Lilian sentiu Gabriel apertar a sua mão, e quando olhou para ele, soube que sim. Estava finalmente livre para viver a sua própria história.
***
O sol da manhã atravessava as grandes janelas da residência de Lady Penélope, lançando reflexos dourados sobre o salão. A casa estava mais silenciosa do que nos últimos tempos. O caos do escândalo, dos confrontos e das decisões já havia passado. Agora, restava apenas o futuro, e a reconstrução do que fora perdido.
Gabriel estava de pé junto à lareira, os olhos fixos na carta que recebera naquela manhã. A resposta formal do Rei ao seu pedido. A sua missão como corsário chegara ao fim. Ele era livre para escolher o seu próprio destino.